Na Praça Kontraktova, na capital Kyiv, é enorme a fila para entrar na exposição "Módulo Temporal", a primeira desde o início da invasão da Federação Russa, a 24 de fevereiro de 2022. Lá dentro, uma gigantesca bandeira da Ucrânia descaída entre dois andares, com um símbolo da paz em graffiti branco, e dois quadros de Vhils.
"Não há muita arte como esta na Ucrânia... a bandeira, por exemplo, é fantástica, traz um pouco de felicidade às nossas vidas, é uma distração da guerra, dá para esvaziar a cabeça durante um pouco", diz à Lusa Oleksii, de 21 anos, acompanhado por Kateryna, também com 21.
"[A exposição] foi edificada dentro de contentores, é algo que nunca tinha imaginado. Não há muitos espaços como este. Era bom que houvesses investimento na cultura, mas não há hipótese de o fazer agora", lamenta Kateryna. O casal estava há algum tempo a ver, atentamente, os quadros de Vhils, quando a Lusa os abordou.
As pessoas "não esperavam ver uma das principais praças da cidade com uma exposição" e a estranheza foi o chamariz perfeito, explica Julia Sosnovska, curadora da exposição: "em apenas dez dias recebemos mais de 3.000 visitantes".
Mas o número elevado de curiosos e aficionados pela arte não é apenas justificado pela surpresa que provocou ver contentores utilizados para transportar mercadorias na Kontraktova, é também "uma maneira de as pessoas sentirem que há outros interesses que não a guerra".
Pelos dois andares de contentores metálicos estão dispostas obras de 28 artistas, sete dos quais ucranianos. A guerra é o tema central, num paíshá um ano sob agressão da Rússia, a tentar reerguer-se enquanto a devastação continua nas zonas de combate e incontáveis vidas são ceifadas todos os dias.
Este bairro da cidade é maioritariamente de pessoas mais velhas, mas os visitantes são sobretudo jovens entre 25 e 35 anos. E também há famílias, como uma que entra com o filho, que corre desenfreadamente pelo espaço e apenas para contemplar a enorme bandeira ucraniana, para a qual aponta gritando "Ucrânia, Ucrânia".
Soam as sirenes antiaéreas e pelos altifalantes é anunciado que a exposição vai encerrar até ser seguro. Três MiG-31K levantaram voo em Akhtubinsk, na Rússia, uma localidade colada à fronteira com a Ucrânia. As pessoas saem num ápice. A fila lá fora, que tinha mais de 50 pessoas à espera para entrar, esvazia-se num instante. Regressa a normalidade de um país em guerra, sob invasão de outro.
Não que as pessoas tenham ido a correr para os abrigos. Não foram, simplesmente dispersaram por não saberem quando deixarão de soar as sirenes. Por isso, não vale a pena esperar numa fila que poderá não avançar mais durante o dia de hoje.
Os quadros e as esculturas foram substituídos pelas roulottes de comida e os músicos de rua subitamente ganharam outro interesse. Na entrada da exposição fica apenas uma pessoa. Oleg Mykhailiuk, de 24 anos.
Oleg é estudante de arquitetura e mostra uma vontade que só vai conseguir saciar quando entrar na exposição: "Não vão ser as sirenes ou os bombardeamentos que me vão impedir de entrar."
"A cultura, toda ela, é importante para qualquer sociedade. Em tempo de guerra é ainda mais valiosa. A arte é o oposto da guerra, a guerra representa o que de pior há no ser humano, a arte representa o que há de melhor", explica.
Mais atrás começam a juntar-se algumas pessoas. Já sabem que a Rússia costuma fazer 'bluff' e quando é assim as sirenes "calam-se" - como disse Oleg. Cerca de 20 minutos volta a calma possível.
Atrás de Oleg, a olhar para o smartphone para passar o tempo até à reabertura, está Denys Pylypovych, de 31 anos.
"Vou ficar aqui até poder entrar. É importante para nós, cidadãos, haver estes eventos. São uma distração, ajudam-nos a relaxar, a esquecer por momentos", sublinha.
Para Denys, a arte também pode "mostrar a guerra" por outros olhos, e por essa razão insiste na necessidade "de apoiar o país e a cultura", já que ambos, argumenta, são alvos das forças russas.
As sirenes antiaéreas pararam e atrás de Oleg e de Denys volta a formar-se a fila que tinha dispersado, agora mais consolidada - há mais curiosos. As pessoas chegam a correr para conseguir um dos primeiros lugares.
"Tenho amigos que estão a combater na linha da frente e quando falo com eles, não querem que lhes pergunte sobre como estão as coisas. Querem saber sobre o que estou a fazer, querem provar um pouco da normalidade que nós aqui temos, com algumas adaptações, e que eles não conseguem ter", explica à Lusa a curadora da exposição.
Alguns, acrescenta, já pediram algumas fotografias e "disseram que quando voltarem querem visitá-la".
"A cultura faz falta neste país, agora mais do que nunca", reconhece Julia.
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"Não há muita arte como esta na Ucrânia... a bandeira, por exemplo, é fantástica, traz um pouco de felicidade às nossas vidas, é uma distração da guerra, dá para esvaziar a cabeça durante um pouco", diz à Lusa Oleksii, de 21 anos, acompanhado por Kateryna, também com 21.
"[A exposição] foi edificada dentro de contentores, é algo que nunca tinha imaginado. Não há muitos espaços como este. Era bom que houvesses investimento na cultura, mas não há hipótese de o fazer agora", lamenta Kateryna. O casal estava há algum tempo a ver, atentamente, os quadros de Vhils, quando a Lusa os abordou.
As pessoas "não esperavam ver uma das principais praças da cidade com uma exposição" e a estranheza foi o chamariz perfeito, explica Julia Sosnovska, curadora da exposição: "em apenas dez dias recebemos mais de 3.000 visitantes".
Mas o número elevado de curiosos e aficionados pela arte não é apenas justificado pela surpresa que provocou ver contentores utilizados para transportar mercadorias na Kontraktova, é também "uma maneira de as pessoas sentirem que há outros interesses que não a guerra".
Pelos dois andares de contentores metálicos estão dispostas obras de 28 artistas, sete dos quais ucranianos. A guerra é o tema central, num paíshá um ano sob agressão da Rússia, a tentar reerguer-se enquanto a devastação continua nas zonas de combate e incontáveis vidas são ceifadas todos os dias.
Este bairro da cidade é maioritariamente de pessoas mais velhas, mas os visitantes são sobretudo jovens entre 25 e 35 anos. E também há famílias, como uma que entra com o filho, que corre desenfreadamente pelo espaço e apenas para contemplar a enorme bandeira ucraniana, para a qual aponta gritando "Ucrânia, Ucrânia".
Soam as sirenes antiaéreas e pelos altifalantes é anunciado que a exposição vai encerrar até ser seguro. Três MiG-31K levantaram voo em Akhtubinsk, na Rússia, uma localidade colada à fronteira com a Ucrânia. As pessoas saem num ápice. A fila lá fora, que tinha mais de 50 pessoas à espera para entrar, esvazia-se num instante. Regressa a normalidade de um país em guerra, sob invasão de outro.
Não que as pessoas tenham ido a correr para os abrigos. Não foram, simplesmente dispersaram por não saberem quando deixarão de soar as sirenes. Por isso, não vale a pena esperar numa fila que poderá não avançar mais durante o dia de hoje.
Os quadros e as esculturas foram substituídos pelas roulottes de comida e os músicos de rua subitamente ganharam outro interesse. Na entrada da exposição fica apenas uma pessoa. Oleg Mykhailiuk, de 24 anos.
Oleg é estudante de arquitetura e mostra uma vontade que só vai conseguir saciar quando entrar na exposição: "Não vão ser as sirenes ou os bombardeamentos que me vão impedir de entrar."
"A cultura, toda ela, é importante para qualquer sociedade. Em tempo de guerra é ainda mais valiosa. A arte é o oposto da guerra, a guerra representa o que de pior há no ser humano, a arte representa o que há de melhor", explica.
Mais atrás começam a juntar-se algumas pessoas. Já sabem que a Rússia costuma fazer 'bluff' e quando é assim as sirenes "calam-se" - como disse Oleg. Cerca de 20 minutos volta a calma possível.
Atrás de Oleg, a olhar para o smartphone para passar o tempo até à reabertura, está Denys Pylypovych, de 31 anos.
"Vou ficar aqui até poder entrar. É importante para nós, cidadãos, haver estes eventos. São uma distração, ajudam-nos a relaxar, a esquecer por momentos", sublinha.
Para Denys, a arte também pode "mostrar a guerra" por outros olhos, e por essa razão insiste na necessidade "de apoiar o país e a cultura", já que ambos, argumenta, são alvos das forças russas.
As sirenes antiaéreas pararam e atrás de Oleg e de Denys volta a formar-se a fila que tinha dispersado, agora mais consolidada - há mais curiosos. As pessoas chegam a correr para conseguir um dos primeiros lugares.
"Tenho amigos que estão a combater na linha da frente e quando falo com eles, não querem que lhes pergunte sobre como estão as coisas. Querem saber sobre o que estou a fazer, querem provar um pouco da normalidade que nós aqui temos, com algumas adaptações, e que eles não conseguem ter", explica à Lusa a curadora da exposição.
Alguns, acrescenta, já pediram algumas fotografias e "disseram que quando voltarem querem visitá-la".
"A cultura faz falta neste país, agora mais do que nunca", reconhece Julia.
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