"Na Turquia e na Europa [União Europeia] estamos na expectativa até à realização das eleições. Se existir uma alteração na Turquia, não será uma simples alteração de Governo como sucede em Portugal, onde um partido sucede a outro, ou na Grécia, ou em outros países europeus", assinalou em entrevista à Lusa Vassilis Papadopoulos, 63 anos, que assumiu funções em Lisboa em dezembro passado.
Nas eleições legislativas e presidenciais de 14 de maio próximo, o Presidente Recep Tayyip Erdogan, no poder desde 2003, confronta-se com um candidato apoiado por seis forças da oposição, e as sondagens admitem a derrota do também líder do Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP, islamita-conservador) que domina o Parlamento de Ancara.
"Erdogan está no poder há muito tempo, e como é de esperar em situações similares identificou-se de alguma forma com o Estado. Os relatórios de organizações internacionais sobre o estado da democracia na Turquia, governamentais e não-governamentais, não são muito encorajadores", prosseguiu o embaixador, que até finais de 2022 assumiu as funções de secretário-geral da Presidência da República helénica.
Papadopoulos, autor diversos romances e ensaios que também refletem a sua longa experiência diplomática, prevê que uma eventual mudança política na Turquia seja "um fenómeno mais radical e difícil, em comparação com a alternância de partidos políticos nos países europeus", mas reconhece que Erdogan tem demonstrado "grande adaptabilidade" e tem sido um "grande líder" para o seu povo.
"E também demonstrou a capacidade para alterar o seu pensamento e adaptar-se em momentos de grandes dificuldades", prosseguiu o diplomata, ao recordar que a posição do líder turco em relação à Grécia foi "muito positiva" até ao fracassado e sangrento golpe militar de julho de 2016.
"Mas depois, mudou completamente, a as relações com a Turquia têm sido muito mais difíceis para nós", frisou, numa comprovação da prioridade concedida pela diplomacia de Atenas às relações com o poderoso vizinho e que nos últimos anos têm conhecido diversas oscilações.
O embaixador grego, que no seu longo currículo já representou o seu país nas embaixadas da Grécia na Roménia e Ucrânia, sublinhou contudo a recente melhoria de relações com a Turquia após os devastadores sismos de fevereiro passado que atingiram o sudeste turco e o norte sírio.
"Uma vez mais, um desastre teve um impacto secundário positivo e notei que a Turquia faz um esforço para melhorar as relações com todos os países vizinhos, incluindo a Grécia. É positivo para nós, sempre pretendemos o diálogo e boas relações de vizinhança".
A questão das migrações, para além das disputas territoriais no mar Egeu, tem ainda originado constantes fricções entre as duas capitais, apesar de o diplomata também detetar progressos mútuos e destacar a função "crucial" da Frontex, a Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira.
"Não creio que a Turquia esteja a instrumentalizar a questão das migrações, a trágica necessidade de seres humanos tentarem encontrar uma nova vida após fugirem dos seus países porque são oprimidos".
Numa referência às ilhas gregas do Egeu, e às ameaça veladas da liderança turca sobre uma eventual ação militar na região, Papadopoulos recordou tratarem-se das "fronteiras marítimas" do país e que permanecem sob vigilância constante, também para a contenção da imigração ilegal.
"Neste aspeto temos de estar muito agradecidos à Frontex [Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira], fizeram um grande trabalho, ajudaram muito não apenas do ponto de vista técnico mas também simbólico. Demonstraram que estas fronteiras são europeias, e que se trata de um problema europeu porque os migrantes quando entram na Grécia não ficam na Grécia. Imediatamente pretendem partir para outros países europeus e julgo que neste aspeto a presença da Frontex é crucial".
Sobre diversos relatórios recentes que acusam a Agência da União Europeia de atitudes discriminatórias e repressivas face aos migrantes e requerentes de asilo, o diplomata referiu-se a um "trabalho muito difícil", com admissíveis atuações díspares, mas frisou que a Grécia não pode enfrentar isoladamente um fenómeno que se tornou numa questão global.
"Durante a minha passagem pela ONU recordo que a forma de encontrar uma solução e ajudar países em guerra ou em extrema pobreza seria tentar que esses problemas fossem enfrentados e resolvidos a partir dos próprios países, com o objetivo de impedir a imigração ilegal. Começar aí. Enquanto isso não for feito, teremos de proteger as fronteiras europeias", sustentou.
Apesar dos progressos que assinalou, o diplomata recordou ainda a "grande flexibilidade" das redes que praticam o tráfico humano e a forma como enviam os migrantes em direção à Europa, após detetarem onde existe maior permissividade.
"No caso de a situação se tornar mais difícil nas fronteiras gregas, de imediato enviam-nos em direção a Itália ou Bulgária...", disse, antes de sublinhar as recentes medidas de Atenas nesta área.
"A fronteira terrestre com a Turquia está mais segura, não apenas devido à construção do muro [instalado desde agosto de 2021 na fronteira comum, com uma extensão de 40 quilómetros e um sistema de vigilância] mas por uma série de medidas que tornam muito difícil o prosseguimento do afluxo da imigração ilegal".
Ao abordar a situação política interna, o embaixador revelou-se mais reservado, atendendo às suas funções de "representante do Governo mas também do país".
No entanto, e numa referência às próximas eleições legislativas gregas de 21 de maio, reconhece que o atual Governo conservador de Kyriakos registou uma importante queda eleitoral na sequência do desastre ferroviário de Tempi em 27 de fevereiro passado, que provocou 57 mortos.
"Agora, e segundo entendo, a Nova Democracia [ND, no poder e liderada pelo primeiro-ministro] está a recuperar um pouco a sua percentagem. Não posso prever o que sucederá até 21 de maio, talvez esta tendência prossiga, ou não", sublinhou, sem deixar de recorrer a uma frase atribuída a Harold Macmillan, antigo chefe de Governo conservador britânico: 'Uma semana é muito tempo em política'.
Neste cenário, admite uma "segunda volta das legislativas" e que será muito difícil uma "solução comum" após o escrutínio de 21 de maio, onde vai funcionar o sistema proporcional, e que será alterado no caso de novas eleições.
"No sistema proporcional são necessários 46% dos votos para uma maioria absoluta, nas segundas serão apenas necessários 38%", recordou, numa referência ao programado regresso à anterior lei eleitoral que fornece um "bónus" de 50 deputados, num total de 300, ao partido mais votado.
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"Erdogan está no poder há muito tempo, e como é de esperar em situações similares identificou-se de alguma forma com o Estado. Os relatórios de organizações internacionais sobre o estado da democracia na Turquia, governamentais e não-governamentais, não são muito encorajadores", prosseguiu o embaixador, que até finais de 2022 assumiu as funções de secretário-geral da Presidência da República helénica.
Papadopoulos, autor diversos romances e ensaios que também refletem a sua longa experiência diplomática, prevê que uma eventual mudança política na Turquia seja "um fenómeno mais radical e difícil, em comparação com a alternância de partidos políticos nos países europeus", mas reconhece que Erdogan tem demonstrado "grande adaptabilidade" e tem sido um "grande líder" para o seu povo.
"E também demonstrou a capacidade para alterar o seu pensamento e adaptar-se em momentos de grandes dificuldades", prosseguiu o diplomata, ao recordar que a posição do líder turco em relação à Grécia foi "muito positiva" até ao fracassado e sangrento golpe militar de julho de 2016.
"Mas depois, mudou completamente, a as relações com a Turquia têm sido muito mais difíceis para nós", frisou, numa comprovação da prioridade concedida pela diplomacia de Atenas às relações com o poderoso vizinho e que nos últimos anos têm conhecido diversas oscilações.
O embaixador grego, que no seu longo currículo já representou o seu país nas embaixadas da Grécia na Roménia e Ucrânia, sublinhou contudo a recente melhoria de relações com a Turquia após os devastadores sismos de fevereiro passado que atingiram o sudeste turco e o norte sírio.
"Uma vez mais, um desastre teve um impacto secundário positivo e notei que a Turquia faz um esforço para melhorar as relações com todos os países vizinhos, incluindo a Grécia. É positivo para nós, sempre pretendemos o diálogo e boas relações de vizinhança".
A questão das migrações, para além das disputas territoriais no mar Egeu, tem ainda originado constantes fricções entre as duas capitais, apesar de o diplomata também detetar progressos mútuos e destacar a função "crucial" da Frontex, a Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira.
"Não creio que a Turquia esteja a instrumentalizar a questão das migrações, a trágica necessidade de seres humanos tentarem encontrar uma nova vida após fugirem dos seus países porque são oprimidos".
Numa referência às ilhas gregas do Egeu, e às ameaça veladas da liderança turca sobre uma eventual ação militar na região, Papadopoulos recordou tratarem-se das "fronteiras marítimas" do país e que permanecem sob vigilância constante, também para a contenção da imigração ilegal.
"Neste aspeto temos de estar muito agradecidos à Frontex [Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira], fizeram um grande trabalho, ajudaram muito não apenas do ponto de vista técnico mas também simbólico. Demonstraram que estas fronteiras são europeias, e que se trata de um problema europeu porque os migrantes quando entram na Grécia não ficam na Grécia. Imediatamente pretendem partir para outros países europeus e julgo que neste aspeto a presença da Frontex é crucial".
Sobre diversos relatórios recentes que acusam a Agência da União Europeia de atitudes discriminatórias e repressivas face aos migrantes e requerentes de asilo, o diplomata referiu-se a um "trabalho muito difícil", com admissíveis atuações díspares, mas frisou que a Grécia não pode enfrentar isoladamente um fenómeno que se tornou numa questão global.
"Durante a minha passagem pela ONU recordo que a forma de encontrar uma solução e ajudar países em guerra ou em extrema pobreza seria tentar que esses problemas fossem enfrentados e resolvidos a partir dos próprios países, com o objetivo de impedir a imigração ilegal. Começar aí. Enquanto isso não for feito, teremos de proteger as fronteiras europeias", sustentou.
Apesar dos progressos que assinalou, o diplomata recordou ainda a "grande flexibilidade" das redes que praticam o tráfico humano e a forma como enviam os migrantes em direção à Europa, após detetarem onde existe maior permissividade.
"No caso de a situação se tornar mais difícil nas fronteiras gregas, de imediato enviam-nos em direção a Itália ou Bulgária...", disse, antes de sublinhar as recentes medidas de Atenas nesta área.
"A fronteira terrestre com a Turquia está mais segura, não apenas devido à construção do muro [instalado desde agosto de 2021 na fronteira comum, com uma extensão de 40 quilómetros e um sistema de vigilância] mas por uma série de medidas que tornam muito difícil o prosseguimento do afluxo da imigração ilegal".
Ao abordar a situação política interna, o embaixador revelou-se mais reservado, atendendo às suas funções de "representante do Governo mas também do país".
No entanto, e numa referência às próximas eleições legislativas gregas de 21 de maio, reconhece que o atual Governo conservador de Kyriakos registou uma importante queda eleitoral na sequência do desastre ferroviário de Tempi em 27 de fevereiro passado, que provocou 57 mortos.
"Agora, e segundo entendo, a Nova Democracia [ND, no poder e liderada pelo primeiro-ministro] está a recuperar um pouco a sua percentagem. Não posso prever o que sucederá até 21 de maio, talvez esta tendência prossiga, ou não", sublinhou, sem deixar de recorrer a uma frase atribuída a Harold Macmillan, antigo chefe de Governo conservador britânico: 'Uma semana é muito tempo em política'.
Neste cenário, admite uma "segunda volta das legislativas" e que será muito difícil uma "solução comum" após o escrutínio de 21 de maio, onde vai funcionar o sistema proporcional, e que será alterado no caso de novas eleições.
"No sistema proporcional são necessários 46% dos votos para uma maioria absoluta, nas segundas serão apenas necessários 38%", recordou, numa referência ao programado regresso à anterior lei eleitoral que fornece um "bónus" de 50 deputados, num total de 300, ao partido mais votado.
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